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Irae / Velório - "Deceiver's Light" Review

Os meados de Abril foram tomados de assalto com o lançamento de "Deceiver's Light", o Split-CD de Velório e Irae, um disco que chega até nós através da portuguesa Nekrogoat Heresy Productions e que, no meu entender, será considerado um ícone do black metal nacional nos tempos que se seguem, um must em qualquer estante de CDs dos amantes deste sub-género do metal.

Já todos sabemos o que representa Irae em Portugal ou, pelo menos, assim creio, mas o que significa Velório? Nada mais, nada menos, do que o projecto a solo de Angel-0, o conhecido guitarrista que aparece em palco com Corpus Christii ou Irae. Para os conhecedores, Angel-0 já apareceu sob o nome Velório na compilação "Lusitânia Dark Horde II", com o tema "Rite Of The Black Lord", mas este "Deceiver's Light" é considerado o seu primeiro trabalho.

Se os amantes do black metal já sabem o que esperar deste senhor enquanto hired-gun das bandas atrás referidas, vamos elevar a fasquia e observá-lo enquanto criador e intérprete do seu próprio trabalho.

Através de uma mistura entre orações religiosas e uma introdução de órgão sinistra, é assim que se inicia esta demanda negra sob a forma do tema "Unholy Grace". Apesar de ser um tema directo e sem rodeios, começa a ser perceptível uma viagem entre o apocalíptico e o bélico através de riffs que rasgam sem dó nem piedade. As mudanças entre os quatro temas são preenchidas com as tais orações e cânticos religiosos, algo que não vou aprofundar, mas apenas dar um ponto de situação neste momento da minha intervenção.

O tema "Burying The Dead" aparenta ser mais uma composição ortodoxa, no entanto é-nos apresentada uma veia atmosférica na parte final, o que mostra a forte imaginação de Angel-0. E se já falei em termos como apocalíptico ou bélico, não posso deixar de referir a raiva e algum teor desesperante em "The Widow's Son": um tema rápido, frio e até com algum shredding de guitarra.

Muitas vezes se diz que o melhor está no final, pois bem... É com a faixa "Logaeth" que aplico essa expressão tão popular. A lugubridade de "Logaeth" é acompanhada por uma lead-guitar que não desata e que torna o seu epílogo numa passagem esplendorosa que nos transmite o final de algo que foi tão intenso, negro e puro. É também aqui que Angel-0 não se deixa ficar por uma composição regular e combina a melodia, mesmo que obscura, na sua expressão musical.

Terminada que está a revisão à primeira parte deste Split-CD, segue-se a blasfémia ultra-directa e monstruosidade raivosa de Irae, o já tão conhecido projecto de Vulturius. A personificação do ódio à humanidade é bastante evidente no tema de entrada "Let's Start Killing People", onde a erosão de crenças materiais e espirituais é demonstrada lírica e musicalmente.

E se a proclamação do final dos tempos conhecidos através de acção humana foi feita no tema anterior, em "Allegiance" encontra-se a aliança entre o humano e o metafísico satânico sob a forma de demónios e destruição. Assim, toda essa dita destruição culmina num triturante riff de lead-guitar antecedendo um solo combinado com trovoada e ruído.

Numa abordagem compassada que faz lembrar os primórdios do black metal, Irae presta, a meu ver, homenagem à essência do género com o tema "Prime Evil Black Metal" onde Satanás, sangue, fogo e misantropia são os ingredientes equacionados com mais um solo que termina o tema, desta vez mais melódico.

Contudo, o terror blasfémico é despoletado com "Fátima em Ruínas", um tema que tem feito a delícia de muitos nos recentes concertos de Irae. Sem qualquer respeito ao que a fé católica possa representar, Vulturius exprime toda a sua revolta contra um síto que, como ele já disse em voz alta (em Aveiro), lhe mete nojo. Entre ritmos frenéticos e passagens que roçam o marcial, nota-se claramente que esta faixa constitui a verdadeira intenção de lançar o caos!

"...Pelo Corno de Satanás" representa a obscuridade que a lentidão pode reflectir - não é só de rapidez e agressividade que a escuridão é constituída, pois que pode ser também criada através de um ritmo lento e mórbido; uma oração àquilo que Irae representa na Terra.

Tudo acaba como começa e através de "Bestial Molestor" é conjugada uma depravação leviana de destruição massiva, mais uma vez lírica e musicalmente. Tudo acaba num ritmado jogo de riffs que nos faz pensar num gráfico que tanto toca no máximo como desce repentinamente para o abismo. Irae é isto... palavras para quê?

Para finalizar, um disco não é feito só de música, mas também do artwork. Arrisco até a dizer: mas que belo artwork para um lançamento underground... Um belíssimo digipak envernizado composto por fotos de Vulturius e Angel-0 em todo o seu negro e caótico esplendor.

Nota: 8/10

Review por Diogo Ferreira